Gal e Rolando

Poxa vida.

Gal Costa e Rolando Boldrin no mesmo dia. Duas pessoas tão importantes pra mim e pra tanta gente.

Se Gal foi a rainha, pois nos 80 quando criança era ela a musa dos sucessos. Rolando formou meu caráter brasileiro nos programas de domingo de manhã. Que não perdia 1 depois de ver o Globo Rural. E antes da fórmula 1 com meu pai.

Com ele aprendi a amar o Brasil profundo, com ela entendi a grandeza da música pop. Ainda criança.

Isso com 7 ou 8 anos, criança de tudo. Mas que amava moda de viola e os sucessos da Gal em novelas e nas rádios.

Depois, já adolescente, me aprofundei na obra da Gal e vi a envergadura de sua obra. O peso, a experimentação e sua magnífica voz. Uma obra diversa, rica e muito forte. Escutei demais dos meus 15 aos 20. Muito mesmo, de nem escutar tem uns anos.

Mas ontem com sua partida, fiquei numa tristeza única, de choramingar pelos cantos da firma e esconder as lágrimas. De no almoço emocionar com suas músicas na rádio que tocava na padaria. Tipo perder uma tia que você ama muito.

Vai ser duro perder essa geração, que hoje tão na casa dos 80 anos. Todos importantes demais pra mim, todos formaram muita coisa. Me deram norte e princípios. Valores. Me jogaram pro lado da arte e do estudo. Do querer saber e conhecer mais. Me apresentaram nomes. Nunca esquecerei de eu menino olhando os rótulos dos discos pra saber quem eram os compositores.

Obrigado Rolando, obrigado Gal. Muito do amor que tenho e me mantém vivo foi vocês que me deram

“Pra todo aquele que só fala que eu não sei viver

Chega lá em casa pruma visitinha

Que no verso ou no reverso da vida inteirinha

Há de encontrar-me num cateretê”

Lista

Publicado em 18 de agosto às 10:31 no Baderna Cultural ·

Hoje, a Folha traz uma ~lista~ (http://www1.folha.uol.com.br/infograficos/2013/08/19408-quarenta-discos-que-fazem-quarenta-anos.shtml) com os 20 melhores álbuns nacionais de 1973. Tem também os 20 internacionais, mas sobre está, nem quero entrar em discussão. Já havia comentado aqui sobre este ano (https://www.facebook.com/badernacultural/posts/626709394019710). Uma coisa que chama logo a atenção é o primeiro lugar para o álbum do João Gilberto daquele ano. O famoso disco com a capa branca; genial, inovador e até arriscaria revolucionário, dentro da obra do JG e da música brasileira. Ou seja, concordo com o primeiro lugar! Mas como toda lista é feita para se criticar, se não qual o sentido de se dar o trabalho de fazer a pesquisa e tal. Em uma rápida pesquisa na memória e na internet para confirmar, já lembrei de dois que ficaram de fora, que eu colocaria, o “Quem é Quem” do João Donato e o “Araçá Azul” do Caetano.
Começo pelo do Caetano, que com certeza não foi o mais vendido, muito pelo contrário, e nem o melhor de sua carreira. Mas é certamente o disco onde o cantor baiano mais radicaliza no que começou no tropicalismo, um discaço. Mistura de ritmos, entrada pesado na música do Recôncavo, experimentações e até canções dão o ritmo dele.
Já o Donato, é se não o melhor, um dos melhores discos de suingue brasileiro. O que o João faz neste álbum é, não só memorável, como abriria as portas para toda uma cultura e um jeito de se fazer esse tipo de som no país.. Lembremos que Jorge Ben neste período, estava em sua fase de transição, da formação um tanto quanto jazzística, para a porrada que é o “Tábua de Esmeralda”, mas o “Quem é Quem”, não buscava a mesma coisa que o disco de Jorge Ben, na minha opinião ele buscava pura e simplesmente a música, o som e a levada. Alguns podem dizer que o Marcos Valle já vinha fazendo algo neste sentido, concordo. Mas que trouxe a negócio redondo foi o Donato. O balanço que o Donato traz nesse disco é algo certamente novo e potente que influenciou toda uma turma (vide o “Cantar” da Gal). E até hoje o que se ouve de sons que tentam se aproximar dele é até difícil de falar. Ouçam e bom domingo:

https://www.youtube.com/watch?v=oNgGR3BmCOg
https://www.youtube.com/watch?v=KTp5hbfA0no
(texto por Rafael S. N. Mendonça)

Festival Eletronika dia 1 e Eletronika. Dia 2. OIEEEEEEEEE!!!!!!!

Textos do Eletronika que ocorreu em BH em novembro de 2015 e que não estavam guardados aqui.

Aí que o trem ontem no Eletronika começou devagar com muito pouco público mas com o DJ Dolores e o Chico Corrêa mandando um som inacreditavelmente moderno, tradicional e original, no melhor estilo pedrada nordestina. E quem viu viu, a parceria dos dois é uma experiência sonora ímpar e impressionante. Alegria de ter visto isso. Mas ainda sim com muito pouca gente na praça.

Mas devagarinho o POVO foi chegando e quando digo povo era povo mesmo.

Gente de todos os cantos da cidade, dos tios de cabelos grisalhos em suas camisas sociais até a moçada do funk da periferia, passando por patricinhas descoladas com suas sacolas da tal loja que abriu agora aos hipsters mineiros. E foi todo mundo chegando. E se enturmando. E CONVIVENDO.

E quando o OMULU começou seu set, colocou esse povo todo pra dançar, e quando digo dançar é dançar mesmo. Todo mundo suando junto na quente noite da capital mineira. Eu disse junto!

Dançando funk, brasileiro, americano, sucessos, não sucessos dos mais variados estilos que saiam da caixas de som mandados pelo Omulu e levavam as senhoras que ficaram de lado assistindo a confusão, batendo o pezinho no chão. Para desespero do…

Foi a festa da ANTI-GENTRIFICAÇÃO (proj Marcos Boffa). Na minha opinião projeto com dinheiro público tem que ser assim, pra todo mundo.Não adianta fazer como há algumas semanas que fecham praça com uma programação maravilhosa mas na real quem não tinha os cobres cobrados, a título de “doação e caridade”, ficou de fora. E já tem outra festa marcada nas próximas semanas que fechará algum lugar da Savassi.

Mas deixando as minhas encrencas de lado, o que tivemos ontem foi uma festa linda com os VJs responsáveis pelas suas perfomances aproveitando a praça e o sisudo palácio da liberdade de maneira marcante. Uma noite memorável para quem em tempos tão nublados ainda acredita na convivência entre todos.

Dia 2. OIEEEEEEEEE!!!!!!!

Penso que um erro do brasileiro está no fato de ignorar demais as coisas feita pela América Latina afora. Sempre foi assim e devagarinho tem se mudado isso em alguns círculos.

Ontem a noite no Eletronika, fui um desfile de latinidade, Chancha Vìa Circuito, Dengue Dengue Dengue e Quantic Music desceram o bambu, cada um no seu parquinho, mas foi um festival de pancadarias que ainda estamos assimilando.

O Chancha com sua cumbia malemolente e viajandona fez o cheiro de incenso pairar pela praça da liberdade entre generosos goles de catuaba. Uma introdução muito bela para o que viria pela frente. O som do argentino te deixa em uma espécie de transe. Com suas bases mais arrastadas e seus gritos de “Oeeeeee” feitos de maneira preguiçosa e matreira. Um som que traz muita coisa boa. E te deixa feliz, sério, felizão.

Daí entraram os rapazes do DDD. E o pau começou a quebrar de cara, um outro tipo de passeio pelos becos da música latina. Os caras não devem ter nem 30 anos, mas em cima do palco fica parecendo que estão nessa há esse tempo. Potência pura. Aquilo que era malemolência latina no Chancha, vira energia e graves no DDD.

Certa altura do campeonato os caras começaram a colocar músicas brasileiras, Bin ladem e outras coisas do batidão, e é muito legal ver como os meninos do Peru veem as coisas daqui e como é a leitura deles pra isso. Foi uma viagem pesada sacar isso e eu particularmente gostei demais do resultado, o quantic também mandou sua “interpretação” e também foi bem bom.

E veio o quantic, djzão, desses que tão na estrada há muito tempo e sabem exatamente o que tão fazendo ali. Manda um som certeiro que vai ganhando o povo e quando você se dá conta, tá a turma toda pulando junto com o cara. Um fera.

E voltando ao primeiro parágrafo, como a gente não tem lá muita cultura latina, o conjunto da obra vira um trabalho na linha da cintura de referências. Toda hora é um timbre, um sampler, um som novo que a gente pega no ar e se vê chapado tentando entender a coisa toda. Admirando e bebendo aquilo como se fosse em sucessão de primeiras vezes. Deleite puro.

E pra terminar queria deixar registrado, mais uma vez, a satisfação e alegria que foi ver aquela praça tão simbólica, para o bem e para o mal, tomada por todo mundo de todos os lugares da cidade. Agradecer demais aqueles quatro rapazes que no intervalo do show fizeram aquele mini duelo de mcs com a musiquinha que tocava entre um show e outro. Agradecer demais a turma que deixou esse domingo de feriadão, em um dos dias mais memoráveis nos últimos tempos da cidade.

Nesse momento que cê vê o bem que coisas tipo a Praia da Estação fazem para a cidade. Parabéns ao Eletronika por não sucumbir a moda da cerquinha e deixar a turma a vontade pra ocupar e viver aquele lugar. Aos meninos de POUSO ALEGRE, pelo incentivo. Foram dois dias da mais pura celebração musical. O eletronika 2015 vai deixar saudades.

Passou da conta

Já escrevi isso aqui umas 200 vezes. Mas não tá dando respiro e preciso voltar de vez em quando ao tema pra soltar as angústias. Estamos no momento mais desgraçado da história do país, os historiadores por favor me corrijam.

Com o dia de ontem confesso que o pessimismo tomou conta, foram tantas porradas, tantas coisas abjetas aprovadas em alguma etapa do processo legislativo que me vi perdido. Sem chão.

E infelizmente assistimos a tudo em um estado de estupefação que nos deixa meio sem saber. Um governo federal que não consegue sair das cordas e segue apanhando. É muita incapacidade de reação. É muita dificuldade pra impor seu presidencialismo de coalização ou fazer algo para mudar isso.

Os crápulas de todo o espectro político perderam definitivamente o pudor. E estão emplacando toda sua agenda. Canalhas sem vergonha que vão deixar grandes feridas no país. Não lembro onde li isso ontem mas a frase era mais ou menos assim: “Enterrando marcos civilizatórios”.

Aqui na cidade um inepto entreguista está deixando a cidade ao Deus dará.
Pelos relatos e vídeos, 20 minutos de chuva deixaram um dos pontos mais importantes da cidade, onde milhares e milhares de pessoas passam todo dia como se fosse um rio. O governo estadual também manda para a assembleia legislativa projetos para ferrar ainda mais a combalida saúde climática de Minas e obviamente beneficiar grandes empresários.

Me sinto incapaz, triste e tendo somente este espaço para deitar meu corolário. E será aqui então que seguirei mandando estas linhas tortas. Sigamos em frente na batalha.

(Foto: Alex de Jesus/ O Tempo)

Foto de Rafael Mendonça.

José

José era um rapaz inseguro, precisava do que ele chamava de “sinais” para ter certeza de algumas coisas na sua vida. No trabalho, nos amores. José sempre procurava os tais sinais para ver se estava no caminho certo.

Era aquela mensagem no meio da tarde da paquera ou aquele elogio se seu chefe. José acreditava muito nos sinais, achava que sem eles, provavelmente ele estaria fazendo alguma coisa errada, seguindo por um caminho mais tortuoso que deveria. E que obviamente o trem ia dar errado.

Nos amores então, coitado de José, ele nunca sabia se aquele dia sem se falarem era o fim de tudo, ou apenas um dia sem se falarem mesmo.

E a busca pelo amor da sua vida fazia com que ele deixasse escorrer pelos seus dedos outras pessoas, que nunca saberá se poderiam ser o amor da sua vida, exatamente pelo fato de deixar escorrer pelos seus dedos. Acreditava nos sinais e sem que eles viessem ele achava que o lance, por melhor que fosse, estava fadado ao fracasso.

Hoje com 35 anos José está sozinho e segue em busca do amor da sua vida e dos elogios do chefe. E como todos nós, tem dias que chora sozinho na cama.

Rico Dalasam e a força de um artista

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Foto: Marcos Boffa

Belo Horizonte teve uma noite memorável nesta sexta (10/07), boa parte dela representada nestas duas fotos do Marcos Boffa, que inclusive participou dessa empreitada. Passagem rápida, nas horas de discussão sobre tecnologias e como usar, ou não usar, a internet. Quase consegui convencer o amigo da velha guarda Cao Guimarães Emoticon smile. Mas depois teve o show do Rico Dalasam e é aí que eu queria chegar.

Quem tem um mínimo de interesse por música tem obrigação de saber quem é o cara. Não só pela persona, mas pela qualidade do som. Por motivo de for$a maior tinha perdido seu primeiro show na capital, mas dessa vez consegui ir lá conferir.

Amigos, não é que apenas o Rico é fera, é que ele sabe exatamente o que está fazendo aqui. Numa conversa com ele, entre tantas coisas completamente bacanas que me disse, o Rico me deixou com uma frase que me fez pensar: “Eu entendo o risco que corro”. Isso em um contexto de ser um artista de hip hop que assume sua história. Mas serve para toda sua música.

Não é apenas que ele se arrisca ao se assumir homossexual em um meio que sabemos, pode ser bem complicado, mas que ele se arrisca também em sua música, em seu som. O Rico consegue ser popular e ao mesmo tempo original nas suas bases. Seus potentes refrões não estão ali de graça e o peso das suas letras se fazem sentir. Conversando com o Boffa concordamos que quem não ver seus shows em lugares pequenos vai perder a chance da proximidade, porque ele vai ser grande.

E falo isso não só pela minha torcida e pela competência do Rico, falo isso pois o cara tem muita bala na agulha para se impor em um mercado danado de difícil. Um senhor Artista esse Rico Dalasam.

Deixo aqui por último um elogio ao BAIXO Centro Cultural e a garra de sobreviver nesta “grande” cidade que a gente vive. Os caras tão ali fazendo várias coisas feríssimas, se digladiando com a concorrência da porta e temos que ajudar eles a fechar as contas. Acho bem triste a situação, sua entrada com umas duzentas pessoas e no máximo umas 50 dentro pra ver o show do Rico. Com um ingresso a 20 pratas isso é imperdoável. Escrevi dois guardanapos e meio de um texto metendo o pau na cidade por isso e outras coisas, mas pouparei vocês.11705494_10152833646141601_7426034382781976280_o

Redemption day ou um bico para a salvação

Amanhã é Dia de São Victor. O dia renovação de sentimentos inimagináveis. Calos que só quem passa pelo atleticanismo sabe. Só quem já penou com Curê e Dinho entende.

Foi o momento que todas as viradas impossíveis, todos os jogos relaxados foram expugnados do corpo. Todos aquelas partidas com Goiás, Sport, Copas do Brasil, 8 ou 9 semifinais de brasileiro, tudo visto ao vivo no estádio. Foram devidamente embicados pela canela desse cara.

Foram os mais longos 1: 30 de nossas vidas, e terminou. Terminou com uma cidade gritando em uníssono. Uma boa parte dela de raiva. Mas a outra, em um grito de redenção. Do legítimo gozo. Do sentimento que só um nascimento poderia dar.

Quantos casamentos se salvaram, quantos romances começaram. Quantas amizades eternas foram seladas. Amigos abraçados, chorando, e agradecendo por estarem juntos vendo aquele momento. Quanta renovação de esperança na vida representada em menos de um segundo.

Me emociono e tenho certeza que muitos também ao rever.

Me adianto algumas horas, pois fui um desses. Que por um tempo tive certeza que esse momento, não só nos levou para outra fase. Mas levou a vida de todo mundo um pouco pra frente.

É gol do Galo, é gol do Victor.

Sim, ele imita a vida

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Foto: Bruno Cantini

Entendo os que não gostam, mas a frase do Nelson Rodrigues (ou Arrigo Sacchi) de que o futebol é a coisa mais importante entre as coisas desimportantes, se provou tão verdadeira na noite de ontem. Para várias torcidas.

Quantas emoções, testes pra cardíacos e todos os clichês que cês quiserem colocar aqui aconteceram.

No jogo do Galo foi aquela loucura de sempre, tenso. Uma verdadeira estrada dos alpes bolivianos de sentimentos. Teve de tudo. Pênalti perdido, gol na reta final, toró e a glória no final.

O Galo tem se especializado em fazer argumentos para filmes norte-americanos sentimentais sobre superação, já tem bem uns 10. Agora, como bem disse o mestre Cândido , é expurgar um dos últimos fantasmas. O embate contra o ótimo time do Inter é o trauma que faltava jogar longe. Vai ser muito duro.

O Atlético, para a alegria dos secadores, sempre se encalacrou com o Inter, desde que comecei a acompanhar esse trem nos idos de 83. Quanta raiva já passei.

No outro jogo foi quando o futebol imita a vida. No clássico paulista, todos os dramas da vida moderna estavam lá, muito bem representados. Uma derrota para o arqui-rival. E de repente o time sai de uma chave e cai junto de todos os “times sensação” do torneio.

Era pra pegar o Galo do lado de cá, o corpo mole deu um adversário teoricamente mais tranquilo pro Corinthians, mas colocaram em seu caminho o Boca, o River, o Racing, o SP, os azuis. Só dor de cabeça.

Não tem jogo fácil pra ninguém, mesmo. E o campeonato que começa agora vai ser demais. Segura aí meu povo. E aos que não gostam do troço citado lá em cima, vem gente que o trem é bom demais!!!

O amor, a canção e a flor

Pensando aqui, e tenho tido muito tempo para isso, no Amor. Sobre ser amado, amar e o papel da música brasileira na nossa formação amorosa. O cancioneiro popular sempre teve esse ponto de partida. Na verdade tudo, né? Desde sempre o amor foi tema e tanta coisa linda sobre o assunto já apareceu pelo mundo afora, mas é sobre o cancão brasileira que gostaria de tecer essa tese fajuta.

Primeiro porque é a nossa língua, é a que entendemos melhor. Segundo porque a música brasileira apresenta particularidades que a diferenciam do resto do mundo. As orquestrações de Pixinguinha e Radamés, a sutileza de Noel e Chico. A faca na barriga do Brega. Os amores populares do samba. Para mim, tudo isso e muito mais deixa nossa forma de cantar o amor com uma cara muito particular.

Como não sentir seu coração apertado ao ouvir “Pela décima vez”, de Noel Rosa, na voz de Aracy. Ou “Serra da Boa esperança”, do Lamartine, com sua história surreal e tantos outros exemplos. São obras que conseguem mostrar a cara e o caráter brasileiro em sua essência. São capazes de mostrar escancaradamente nossas virtudes, defeitos e loucuras. Algumas delas deixam nossas portas tão abertas que parece que foram feitas para nós mesmos. Uma coisa sem atravessadores.

O amor, que é tão particular, tão pessoal, se torna universal com a música. As identificações não são mais separadas por classe social ou estudo. Seja rico ou seja pobre todos se comoverão ao escutar “Pra São João decidir”, do Lupicínio, ou um “Depois da Vida”, do Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito. Todos querem casar com a Domingas do Jorge Ben.

Eu e você buscamos as mesmas coisas e acredito que quanto mais escutarmos, mais os caminhos ficarão claros e abertos. Melhor pensar no amor e na canção por esses dias.

2 de abril

O dia 2 de abril de 2015 ficará guardado na memória de muita gente. O dia que uma bala, um helicóptero e um mosquito cumpriram seu papel.

O antagonismo entre as tragédias nos deixa arrasado, sensível e atônito mais uma vez.

De um lado uma cena que não deveria ser, mas nos últimos anos se torna cada vez mais parte de nosso cotidiano: a de uma mãe chorando por seu filho em alguma parte pobre do país. São tão comoventes essas cenas e tem ocorrido com tamanha frequência que nossa tristeza e indignação parece que nunca acaba. Um sentimento contínuo de desesperança e revolta.

E esses meninos são vitimados na grande maioria das vezes pela força policial. Uma força falida em seu caráter, que tem que acabar, mudar ou se reinventar. Só quem não enfrenta seus exageros em seu dia a dia pode concordar que uma coisa tão necessária não esteja se dissolvendo na mão de incompetentes.

Do outro lado uma tragédia familiar de uma personalidade pública, no caso, o governador do estado de São Paulo. Que teve seu filho e mais 4 pessoas mortos em um acidente de helicóptero. Uma situação dessa sempre será impressionante, impactante. Que deixará marcas para sempre nas pessoas envolvidas. E isso me deixa mais consternado pelo ocorrido.

E essa em especial envolve muitas coisas do presente do Brasil. Da falência do ser humano, da insensibilidade, do ódio entre diferentes. Mesmo com a informação que tive que as redações seguraram a informação, para a esposa do governador não ficar sabendo pela imprensa e mesmo com todas as diferenças entre certo e errado que tenho com o governador, é impossível não ficar sensibilizado.

Eu aqui nos meus 38 graus de febre, dengoso como manda o figurino, sinto todas as dores. As dores da doença, do Eduardo e do Thomaz e fico com o sonho utópico que uma coisa ajudasse a outra e esse tipo de sentimento ruim, todos os tipos, acontecessem cada vez menos até sua completa extinção na vida cotidiana.